do mesmo autor de casualidades distorcidas. um córtex cerebral imprensado pelos lados direito e esquerdo. a fúria das letras foi debelada, permitindo a fuga de doze mil línguas ferinas. e somente uma sobreviverá.
quarta-feira, 4 de maio de 2011
Detetive
Havia o cara de agasalho do Corinthians. E havia o homem de paletó de veludo marrom. Tinha o sujeito de camisa xadrez. Ao meu lado, a mulher de bolas de blush rosa no rosto. À frente e à esquerda, o narigudo que parecia Alain Prost. O sujeito de terno bem cortado batia o pé nervosamente. Esse já é suspeito. A menina com síndrome de Down, falando pelos cotovelos. Melhor se fosse cotó. Sua mãe, avó ou sei lá o quê, numa conivência de dar raiva. O tiozão de blazer amarrotado e meias roxas. No teto, a tubulação de ar assoava todas as impurezas de um sistema de refrigeração indecente, que não filtraria nem um canudo de bosta, se este resolvesse se aventurar por aí. Todas as saídas de ar tinham aquela fita crepe que ondeava freneticamente, tal qual um boneco de posto. E não parava. A saída da esquerda! Agora, a da direita! Você, aí atrás! Agora!, todas juntas!, em uníssono! Penejem, vibrem, suas fitas adesivas mortas! O barulho disso tudo, se você anular a influência externa, é extremamente irritante. Daqueles que fazem você levantar no meio da noite pra fechar a porra da janela. E veio. Um clarão, um flash. Um segundo de plenitude branca explodindo minhas retinas. Ao voltar, caído no chão junto com todos os demais na sala de embarque, o silêncio reinava. O tiozão das meias roxas estava caído ao meu lado, com a cabeça na direção contrária à minha, com seu par de meias invadindo minhas narinas. A última coisa que eu lembro é do cheiro terrível de suor fresco e suor encrustado em tons de marrom, que me fez realizar meu último movimento, abaixando a cabeça que pesava quilos, quando pude ver o rapaz de camisa xadrez indo embora, o único a ficar de pé. Bem que me diziam pra não confiar num sujeito de camisa xadrez. Pelo menos, a Down parava de tagarelar.
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário